quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Qual a especificidade do ser humano?

Cérebro:
· Lentificação e individuação
· Plasticidade e aprendizagem
· Auto-organização

O ser humano quando nasce é prematuro e inacabado, ou seja, o seu desenvolvimento não está completo, daí sermos seres neotenicos. A neotenia designa o inacabamento biológico do ser humano ao nascer, o que implica que a infância seja tão longa, uma vez que o nosso desenvolvimento é lento e que o desenvolvimento do nosso cérebro se faz essencialmente ao longo da nossa vida (apesar de este continuar até à morte do individuo). O facto de sermos seres prematuros e biologicamente inacabados leva a que tenhamos um programa genético aberto, ou seja, não somos predeterminados, nem temos comportamentos orientados. É claro que temos uma programação básica de ordem biológica mas não estamos determinados por um sistema de instintos que defina o nosso desenvolvimento e o nosso comportamento. O nosso desenvolvimento faz-se tendo em conta as influências do meio. Por isso temos um desenvolvimento epigenético.
Como já referi anteriormente, quando nascemos somos prematuros, inacabados biologicamente e o nosso desenvolvimento é muito lento, uma vez que demoramos muito tempo a atingir o pleno desenvolvimento, daí termos uma infância tão longa. A lentidão do desenvolvimento do cérebro e do nosso desenvolvimento constituiu uma vantagem na medida em que possibilita a influência do meio ao longo da vida, permite uma maior capacidade de aprendizagem e uma adaptação ao meio. Por tudo isto a lentificação é uma das características mais importantes do cérebro humano. A individuação também é uma característica do nosso cérebro. Inicialmente pensava-se que o cérebro era igual em todos os indivíduos, ou seja, julgava-se que o desenvolvimento do cérebro obedecia a uma padrão, a uma modelo. A verdade é que os nossos cérebros são diferentes. Mas qual a razão desta diferença? O cérebro humano apresenta diferenças porque os seres humanos tem códigos genéticos diferentes o que faz com que haja um diferente desenvolvimento dos tecidos nervosos e porque cada uma de nós ao longo da nossa vida tem experiências, vivências diferentes. Até mesmo os gémeos homozigóticos apresentam cérebros diferentes (com uma diferente número de células nervosas e com diferentes conexões entre os neurónios) mesmo tendo o mesmo código genético pois têm experiências de vida diferentes devido às diferentes influências do meio. Se à nascença separarmos dois gémeos homozigóticos, sendo um deles criado num bom ambiente familiar num contexto socio-cultural “normal” e o outro criado num quarto fechado sem qualquer tipo de contacto com seres humanos veremos que as diferenças entre eles serão gigantescas, desta forma podemos verificar que as experiências que vivenciamos são cruciais no desenvolvimento cerebral e na individuação dos seres humanos. Assim quando falamos em individuação referimo-nos à distinção entre os seres humanos, desta forma cada pessoa desenvolve mais determinadas áreas cerebrais consoante as suas aptidões, as suas experiências de vida, daqui resulta a diversidade da sociedade devido à individuação de cada um. A lentificação também contribui para a individuação na medida em que sendo o nosso desenvolvimento cerebral lento estamos sujeitos às influência do meio durante mais tempo, vivendo mais experiências diferenciando-nos cada vez mais uns dos outros, ou seja, individualizando-nos. O principal motor da individuação é a plasticidade, é o facto de o nosso cérebro ser maleável, ou seja, de modificar as redes neuronais em função das experiências vividas e do meio em que estamos inseridos. A prova de que o nosso cérebro é plástico é o facto de uma função perdida devido a uma lesão poder ser recuperada por uma área vizinha da zona lesionada, a esta função dá-se o nome de função vincariante ou de suplência do cérebro. A plasticidade permite a aprendizagem e é a aprendizagem que vai possibilitar adaptação a novas situação, pois sendo nós tutores de um programa genético aberto é a aprendizagem que vai assumir as funções que nos outros seres resultam da hereditariedade. Mas como é que o cérebro consegue assimilar tanta informação? Só o consegue fazer graças à auto-organização cerebral que é uma auto-organização permanente. O processo de auto-organização consiste na multiplicação, e na eliminação das redes neuronais, ou seja na selecção das mesmas. Dá-se a multiplicação de redes neuronais quando há uma área cerebral que se desenvolve mais, que é por exemplo o caso de um violoncelista que tem as áreas cerebrais que comanda os dedos mais desenvolvida do que outras pessoas. Quando se dá o inverso, ou seja, quando uma pessoal, por exemplo, deixa de exercer uma determinada tarefa, a área cerebral responsável por essa tarefa vai deixar de ser utilizada, sendo as ligações neuronais desnecessárias, logo eliminadas. Faz-se assim uma selecção das redes neuronais: multiplicando as necessárias e eliminando as desnecessárias.
Por tudo isto o cérebro humano tem a capacidade de apreender e de se adaptar a novas situações, distinguindo-se dos outros seres.


Bibliografia:
Monteiro, Manuela Matos e Ferreira, Pedro Tavares
Ser Humano; Porto Editora

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